"A gente se acostuma a acordar de manhã, sobressaltado porque está na hora, a tomar café correndo porque está atrasado.
A gente se acostuma a ler o jornal no ônibus porque não pode perder tempo na viagem, a comer sanduíches porque não tem tempo para almoçar.
A gente se acostuma a andar nas ruas e ver cartazes, a abrir as revistas e ver anúncios, a ligar a televisão e assistir comerciais.
A gente se acostuma a lutar para ganhar dinheiro, a ganhar menos do que precisa e a pagar mais do que as coisas valem.
A gente se acostuma a morar em apartamentos de fundos e a não ter outra vista que não a das janelas ao redor.
A gente se acostuma a não abrir de todo as cortinas, e a medida que se acostuma, esquece o sol, o ar, a amplidão.
A gente se acostuma à poluição, à luz artificial de ligeiro tremor, ao choque que os olhos levam com a luz natural.
A gente se acostuma às bactérias da água potável, à morte lenta dos rios, à contaminação da água do mar.
A gente se acostuma à violência, e aceitando a violência, que haja número para os mortos. E, aceitando os números, aceita não haver a paz.
A gente se acostuma a coisas demais para não sofrer. A gente se acostuma para não se ralar na aspereza para preservar a pele.
A gente se acostuma para poupar a vida. Que aos poucos se gasta, e que de tanto se acostumar, se perde por si mesma.
A gente se acostuma, eu sei, mas não devia."
(Marina Colassanti)
Imagem Google
Oi Silvia!
ResponderExcluirNooossa que lindo e tão cruelmente verdadeiro! Onde foi que nos perdemos que agora pouco vivemos no corre-corre da vida?
Beijinhos e tudo de bom!
Lá diz o ditado: "o ser humano pode habituar-se a tudo" Mas, concordo com vc, não devia mesmo!
ResponderExcluirAbraço
Ruthia d'O Berço do Mundo
Adoro esse texto e Marina Colassanti. Bj
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